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sábado, julho 27, 2013

Petit, Ester e Jú

Se há pessoas que se devem guardar para sempre na memória, essas pessoas são os avós. 

quarta-feira, janeiro 30, 2013

doze

Perguntou-me como é que eu estava, que tal tinha sido o ano, se a minha vida andava catita. Mas não lhe vi nos olhos a curiosidade de outros tempos, de outro dia há doze anos. Percebi que as coisas mudam, que a história nunca se repete, por mais que acreditemos que amanhã o sol vai nascer como hoje. E como ontem. E como há doze anos. Ele, provavelmente, também não me viu a surpresa disfarçada daquele Janeiro quando ele me pediu um beijo. O nosso primeiro beijo. A verdade é que, passado este tempo todo, ainda lhe reconheço o cheiro do perfume. E sorrio, sempre que me cruzo na rua com alguém que cheira a ele. Aquele perfume vai ser sempre o cheiro dele.  

quinta-feira, janeiro 17, 2013

hat-trick #2.

aeromoça. braço de aeromoço. cruz.



terça-feira, outubro 09, 2012

Casa

É casa aqui. É casa no aconchego do teu abraço, no repenicar do teu beijinho, no calor do teu olhar. É casa quando te leio. É casa quando ligas, quando te sinto no fundo do telefone, um sorriso. É casa quando estás aqui e também quando não estás mas parece que estás porque nunca deixas de estar. É casa quando apareces depois de fingires que desapareceste, quando convidas para jantar de surpresa e esperas que eu leve o vinho.

É casa quando telefonas no caminho para perguntar como corre a viagem, casa quando sinto a orelha vermelha porque estás a pensar em mim. Casa quando passo a ser palavra nas tuas frases. É casa sempre que estás e te sinto. Casa quando escreves, quando cantas, quando me apresentas uma música de que gostas muito e da qual eu nunca ouvi falar.

É sempre casa quando me citas um verso de cor e eu calo o final da frase – mesmo que a saiba – para tu sentires que brilhas para mim. É casa quando escondes o olhar de esguelha que queres que eu não veja.

É casa quando me negas um beijo que depois de dás em troca de outro. É sempre casa quando olhas para mim, quando os teus olhos percorrem os meus lábios e sorriem às minhas palavras, mesmo que não faças ideia do que falo ou porque o digo.

É casa quando os teus olhos dizem que sim ao que a tua boca diz que não, porque é casa conhecer-te melhor a cada passo. Casa sempre que ameaças abraçar-me e cumpres a tua promessa. É casa a sensação de te conhecer hoje melhor do que ontem e pior do que amanhã, porque a doce expectativa de ver em ti aquilo que eu procuro é sempre quente. É casa sempre que penso em ti. Porque é sempre casa quando chegamos e nos sentimos bem. E tu és esse sítio.

É casa quando chego, casa quando cheiro, casa sempre que tu estás, onde tu estás. É casa quando tenho saudades e sempre que as mato. É casa em ti.


sexta-feira, setembro 21, 2012

hat-trick.

pedras bonitas. rã alentejana. costa nova.

Não deites fora o que te faz feliz

Ela anda em limpezas. Diz que tem demasiada roupa - sim, ela admite - e anda sempre a comprar mais. Notou que há muitas coisas que já não usa e que só guarda porque sim. Não sabe explicar. É como as cartas de amor da escola primária, que guarda naquelas capas empoeiradas meio-escondidas debaixo da cama. Ou como os talões de compras que vai acumulando no porta-moedas para 'depois fazer contas' mas que, chega o dia em que já não cabem mais, e vão directos para o lixo sem somas. Como aquelas conversas que voltam sempre quando há alguma coisa na vida dela que a leva a pensar nas mentiras que lhe contaram, ou nos beijos que lhe roubaram, ou nos abraços que não lhe deram. Ela guarda tudo com medo que a memória atraiçoe. Sabe que tem boa memória mas insiste em guardar as agendas velhas na prateleira da mesa de cabeceira. Continua a andar com as fotografias metidas no caderninho da carteira, em vez de as pôr numa moldura pela qual vai passar os olhos todos os dias antes de se deitar. Guarda as coisas mais perto com medo que a cabeça não chegue para a lembrar que, por mais perto que os objectos estejam, eles não são as pessoas que lhos deram. Para ela nunca fez sentido desfazer-se do passado. Só que, à medida que acumula os dias na agenda, ela vai percebendo que não há espaço para toda a papelada dos dias que foram passando. E começa a perceber - finalmente - que há um dia em que, na caixa, já só cabem coisas novas se das velhas ela se desfizer.

sábado, maio 19, 2012

a tua casa

Já não sei quando foi. Mas ainda ando com os postais que te escrevi metidos entre as folhas da agenda, que anda sempre comigo na carteira. É amarela, a minha cor preferida. Acho que nunca te disse. Hoje acabaram de esvaziar a tua casa. A caixa de costura e a máquina de costurar foram para Rio Maior, a ver se não me esqueço de as trazer logo que possa. Fiquei com a tua Chanel, espero que não te importes. Pendurei-a um dia destes numa das cadeiras da mesa da sala e, sempre que me aproximo, cheira a ti. Sim, podes acreditar. O papá ligou-me. Diz que está tudo vazio. Deve fazer eco, avó. Imagina só, a tua casa a fazer eco. É difícil imaginar, não é?  

sexta-feira, março 09, 2012

um dia vamos voltar a encontra-nos. tu, sempre a cheirar a noz moscada. eu, sempre à tua espera na cadeira de madeira, no telheiro da cozinha. entretanto, enquanto esse dia não chega, vou lembrar-me de ti. assim.

sábado, fevereiro 18, 2012

apresentações

olá Francisca,
isto está uma confusão mas quando se entra no quarto quente da maternidade, nem se nota, confesso. cheiras tão bem que o perfume do teu cabelo supera todos os aromas de flores, sejam elas quais sejam. é fácil gostar de ti: és tão pequenina como linda, mal choras, comes a horas certas, gostas de tomar banho na água morna naquela banheira de plástico estrategicamente colocada no meio do quarto, és leve como uma pluma, tens um mundo inteiro à tua frente, tens a atenção de toda a gente, tens uma vida inteira para viver. e, no entanto, o mundo gira à tua volta, as visitas não deixam descansar a tua mãe, os colos disputam-te pelo desejo de pegar-te mais um pouco, de sentir este pedaço-de-gente-que-é-o-sinal-mais-real-de-que-a-vida-está-sempre-a-renovar-se.
és isso mesmo: vida. és energia, és esperança, és amor, és ternura, és um ratinho pequeno que se acomoda nos braços das avós e das primas e das tias todas e faz com que se pense que as coisas todas são poucas para descrever a novidade de te ter ao pé de nós.
o tempo anda muito rápido mas a agenda tem sempre vaga para ti, francisca. e vai ser difícil explicar à troika que os cueirinhos têm tecidos macios, bordados e folhos que podem ajudar a esquecer a crise. vai ser complicado olhar-te para os olhos e disfarçar a surpresa de serem de uma cor que não tem nome e de uma curiosidade que mete inveja aos olhares cansados de todos os dias, que lutam contra a velocidade das horas dos dias que passam e que procuram descanso numa almofada com a fronha lavada, ao fim do dia. vai ser difícil explicar-te que às vezes, o dia-a-dia nos cega tanto que não conseguimos ver o que é importante, que nem sempre - por mais que queiramos - conseguimos aquilo que queremos. vai ser desafiante ensinar-te que as cores e os cheiros e as pessoas fazem parte do mundo que nos rodeia, e que a eterna magia das coisas é olhar sempre para elas como tu olhas para nós. como se não as conhecêssemos.
não sei como, mas sustenho a respiração para não te acordar. não quero adiantar-me. vou acompanhar-te por aí.

sexta-feira, fevereiro 03, 2012

anda comigo ao fim do mundo com bons ares.

A liberdade é um trem e nem se discute. Passa por nós, apanhamo-la se conseguirmos. Se quisermos. É flexível até acabarem os carris. No fim do mundo há carris estreitos e o caminho tem princípio mas parece que não acaba. A liberdade aqui mede-se pela resistência que temos à chuva numa estrada de terra batida enquanto esperamos que apareça alguém, ocupe e ofereça boleia no único carro parado, estacionado no meio da estrada. A liberdade do fim do mundo escapa-nos porque somos demasiado pequenas para o silêncio das serras e dos lagos, que se misturam e se tocam, e parecem beijar-se sem pudor durante o dia. Os dias são compridos no fim do mundo, estranhamos que não anoiteça antes de adormecermos e surpreendemo-nos que o dia nasça antes de nos deitarmos.
No fim do mundo falamos línguas diferentes das do dia-a-dia, rimos ao telefone com risinhos de adolescentes e emocionamo-nos no teleférico, enquanto o nariz quase não aguenta a pureza do ar fresco.
No fim do mundo parece que estamos sozinhos na imensidão do lago que arrepia. Ao mesmo tempo parece que nunca havemos de estar sozinhos tal é a imensidão da paisagem. Vamos com amigas, andamos por caminhos de terra batida, roemos maçãs como na música, suculentas, na paragem do comboio do fim do mundo. Mas o frio da terra do fogo pouco se sente quando nos safamos entre as poças de lama, com a rapidez de uns passos meio ansiosos de encontrar aquilo que procuramos ali. Os pés não se baralham, o espanhol fala-se rápido enquanto se inventam palavras que fazem sorrir por não existirem. Bebemos mate muito doce e esperamos que o frio do fim do mundo fique para sempre na memória. Um frio quente, este do fim do mundo. Como o calor de La Boca, que tem as cores todas do mundo. Sejam uma horas ou um par de dias, a cidade é sempre a cidade. Há barulho a toda a hora, pessoas a toda a hora. Cores, carros, cheiros, sabores, palavras. Na cidade quente de verão há avenidas tão largas que não se atravessam de uma só vez. Há a sensação de estar num sítio que conhecemos sempre mas que, ao mesmo tempo, nos obriga a orientarmo-nos no mapa. Há a diversidade de caras, a incompatibilidade de pensamentos, a colecção de memórias boas. Viagens de barco com hora marcada, chuva uruguaia que encharca a roupa e calor que seca o corpo e queima a pele. Vêem-se cavalos à solta num filme inesquecível cujo princípio imperceptível não nos deixa apagar a memória nem terminar a sensação de liberdade. Casas com cores, autocarro com cores, rua com cores, coração com cores.
Seja a Ruta nº3 que nos leva ao mar e deixa-nos pisar o ponto mais a sul do globo antes do pólo. Seja a 9 de Julho que nos suspende a respiração. Seja um beijo. Um abraço. Uma palavra. Há alguma coisa ali. Um mundo inteiro.
Não sei por que te conto estas coisas, que sei que não vais perceber se não fores lá também. O fim do mundo tem coisas assim: deixa-nos a pensar que pode ser onde nós quisermos.

terça-feira, janeiro 24, 2012

quinta-feira, outubro 27, 2011

Disciplina

Obrigo-me a escrever rápido sobre a falta do meu tempo, sobre a correria dos meus dias, sobre a falta de disponibilidade que tenho para escrever sobre mim. Obrigo-me, por isso, a pensar nisto como uma coisa que devia ser essencial, importante, singular. Obrigo-me a escrever assim meio sem pensar, sem reflectir, sem olhar para o texto anterior para ver se escrevi calinada. Obrigo-me a escrever sobre as semanas passadas, sempre a correr, de um lado para o outro, de táxi em táxi, de metro em metro, de carro em carro, de letra em letra, de frase em frase, história em história, de dia em noite e de noite em dia. Obrigo-me porque se não me exijo isso, não vou fazer mais do que o que me exigem os dias. Parece um drama mas não é. Obrigo-me a escrever sobre as saudades que eu tenho de não vos ver todos os dias e de me parecer que há se passaram anos desde aquele dia no aeroporto. Obrigo-me a escrever sobre o nosso almoço depois de tanto tempo, em que me pareceste quase igual, como se o tempo não tivesse passado. Obrigo-me a escrever sobre a correria até dos fins-de-semana, em que além do calor do mimo tenho o mimo do calor de quem me pede para me contar histórias, que me emociona por se emocionar, que me conta segredos íntimos numa intimidade inédita. Exijo-me contar aqui as saudades que eu tenho de cheiros e de sabores de uma cozinha que agora não tem vida, onde a manteiga nunca sai de cima da mesa e de onde o vapor dos vidros desapareceu há anos, porque ali nunca mais ninguém fez sopa de grão de bico com leve sabor a chouriço. Obrigo-me aqui a escrever sobre a loucura que é viver esta vida, sobre a admiração que os outros gabam de uma organização de tempo que eu nem sempre tenho. Exijo-me a avaliar o tempo que guardo para mim. Obrigo-me a adiar essa avaliação porque agora não tenho tempo. Porque este texto escrevi-o ontem à noite, com a cabeça mais livre. E ele apagou-se, insolente. Obriguei-me hoje a escrevê-lo outra vez. Não está igual. Mas é sobre a minha vida. E obrigo-me - tenho de obrigar-me - a escrever sobre ela.

quinta-feira, outubro 06, 2011

do génio e do trabalho.

"Your work is going to fill a large part of your life, and the only way to be truly satisfied is to...love what you do. Your time is limited. Don't waste it living someone else's life.", Steve Jobs

"Para ser grande, sê inteiro: nada/Teu exagera ou exclui./Sê todo em cada coisa. Põe quanto és/No mínimo que fazes./Assim em cada lago a lua toda/Brilha, porque alta vive.", Ricardo Reis.



quarta-feira, setembro 21, 2011

era bom.

que os meus dias tivessem 36 horas. dava-me tanto jeito.

calor.

Não sei como foi tão rápido e veloz, mas passou-se. Passaram-se os fins de tarde compridos, com a brisa fresca do mar a contrastar com o calor das bochechas. Passou-se a sensação de bezuntar o corpo com creme hidratante para a pele não estalar. Passaram-se os petiscos da costa algarvia, alentejana e do centro. Passaram-se os fins-de-semana a correr de carro em carro, de transporte em transporte, de estrada em carris. Passaram-se os aniversários. Tão rapidamente se passaram os dias. Os meses correram velozes, como corre, de resto, todo o tempo agora. Sem pestanejar - ou sem nos apercebermos que pestanejamos, passou o Verão. E já estamos no Outono. Não tarda, o jardim vai encher-se de folhas caducas, alaranjadas e estaladiças. Os dias não tardarão a anoitecer ainda a tarde vai a meio. E as noites vão ser mais frias e escuras. Gosto da sucessão crescente dos dias. Daqueles que vão ficando cada vez mais compridos. Sempre, sempre, mais compridos. E agora - bolas, que rápido que foi - já estou em contagem decrescente. E gosto, tão mais, dos dias crescentes.

segunda-feira, julho 11, 2011

sim, marca.


daqui.
Mais mandona. Mais galinha. Mais responsável. Mais preocupada. Mais com o coração nas mãos. Mais ralada com as notas, com as cópias, com os resumos, com o apagar em vez de emendar. Mais preocupada com o lavar os dentes, com o olhar para as coisas com olhos de ver, com o brio, com a excelência, com a brincadeira e com as coisas sérias. Mais adulta. Mais possessiva. Mais territorial. Mais protectora. Mais ditatorial. Mais afectiva e mais racional. Mais sensível. Mais sisuda. Mais reflexiva. Mais consequente. Mais exigente. Ninguém é mais exigente do que uma irmã mais velha.

quarta-feira, junho 01, 2011

é dia um

dia de confessar que nunca tive jeito para desenho, que sempre quis aprender ballet, que o sinal do "queime-se" era sempre o piscar de olhos, que adorava os pêssegos ainda verdes do pomar do avô Mica. que sempre me assustou o assobiar do titú, que dava tudo pelo pão passado a ferro da avó petit e pelas piadas do avô jú e que gravava a "chuva de estrelas em cassete no rádio que me deram nos anos. é dia de recuperar o caminho de apito em surdina para rio maior, vindos do sanguinhal no dois cavalos do mário cândido, da festa quando o papá chegava de viagem, das horas à espera da avó ester, sentada numa cadeirinha no telheiro da cozinha. é dia de confessar segredos antigos, dia de dizer que aprendi a gostar de ervilhas com a minha madrinha, aprendi a assobiar em jogos de futebol com o papá, num benfica-salgueiros renhido. é dia de lembrar os furas na praia da costa nova e as tripas com chocolate, dia-sim-dia-sim, no zé da tripa. dia de ter saudades dos sorteios que a mã fazia com a aliança para sairmos do banho sem discussões. tempo de lembrar o dia em que comecei a ler e a professora maria alice me levou a ler para a turma do 2º ano da dona isilda. hoje é dia um. é dia de lembrar a camisola com os pom-pons de cores diferentes, as botas ortopéticas para corrigir o pé chato e as primeiras all-star, brancas, que conjugava com as calças azuis claras e amarelas dos cãezinhos, ainda a zara era uma loja que poucos conheciam. é dia de lembrar cheiros e cores e sabores que já não estão todos os dias. mas que deviam estar, fossemos nós crianças para sempre. hoje é dia um.

quinta-feira, maio 12, 2011

éme wor(l)d

Não é um papel que define as coisas. Mas o teu nome está para o meu desde que eu nasci. Fui buscar-te o primeiro apelido, coladinho ao meu. Ofereceste-mo de graça, porque quiseste que, oficialmente, fosse já uma parte de ti, uma continuação tua. Mas ainda antes disso, já te reconhecia a voz. Durante meses falaste comigo, tocaste-me através de uma camada fina de pele que parecia não existir, de tão alta que sentia a tua voz, de tão forte que sabia a ligação. Nem quando tossias e eu tremia, o barulho me assustava. Porque eu sentia-me protegido sob a tua responsabilidade. Não sei porque me escolheste a mim, o que motivou esta escolha, como soubeste que era eu, que tinha que se eu e não outro qualquer. Mas – apesar do desconhecimento – pareces certa da tua escolha, não hesitas um instante que seja, manténs a pose mesmo quando duvidas de uma ou outra atitude, mesmo quando choras depois de me ralhares porque não me porto bem. Eu, de ti, não tenho a dizer mais do que o bem que me fazes, do bom que é um abraço teu, do doce a que me sabe um beijo vindo daí ou do agradável que é sentir o teu cheiro na minha roupa lavada e guardada com cuidado no meu armário. Fazes questão de estar sempre e de dar tudo o que tens. E continuo a estremecer quando sinto que te aproximas. Como no primeiro olhar – em que soube que eras mesmo tu aquela que me falava e eu não via, que soube que eras tu a encarregada pela minha alimentação cuidada e pelo calor e conforto (e até das canções de embalar e das festinhas à noite, quando eu estava mais inquieto). Um dia – penso tantas vezes – quero ser como tu. Continuo, como na primeira vez, a ter a certeza: a minha, não podia ser outra pessoa senão tu, mãe.

segunda-feira, março 21, 2011

da história dos heróis

Lembrei-me, a propósito dos heróis. Ele chamava-lhe Pequenina. Não era um nome inventado naqueles carinhos de namorados, nem um 'petit nom' dos apaixonados. Chamava-lhe Pequenina porque quando ele a conheceu - nunca contaram como foi - ela já era conhecida assim. Era a mais nova de três, a Pequenina. Cabelo louro, quase branco. Era branco, naquela altura. Não há lembranças do que foi o dia em que ele soube que ela estava doente. Não se sabe se chorou. Talvez não, que a emotividade subiu-lhe à cabeça só depois de ela ir. Ou talvez sim, que sempre foi um homem sentimental. Mais do que ela, pelo menos aparentemente. Ela, sim, a Pequenina, era o centro. Verificou-se mais tarde, ser o centro da vida dele. Tão dedicado ao trabalho, tão fiel aos amigos. Tão apaixonado que se deixou ir por ela. Naquele dia em que eles souberam que ela estava doente, não se sabe se chorou. Sabe-se que ela não reagiu bem, que as coisas se complicaram. Calcula-se que o coração dele, sempre frágil, começou a bater mais depressa na esperança de ser tudo mentira. Olhou-a como da primeira vez - não se sabe como nem quando nem onde - e sentiu que se dependesse dele as coisas nem sequer tinham acontecido. E naquele instante, no momento em que a Pequenina foi, ele foi com ela. Fez-se ela. Seu herói.
Lembrei-me (lembraste-me). A propósito dos heróis. Sei que, por mais que o tempo passe e que as coisas mudem, heróis são sempre heróis. Nunca (se) perdem.

quinta-feira, março 17, 2011

do amor.

domingo, janeiro 23, 2011

ressaca.

Acordar cedo com vontade de correr. Tranformar um duche num banho rápido, correr para dentro de umas calças, pôr a música a tocar nos ouvidos, dar uma volta rápida pelos sites portugueses, espanhóis e ingleses. Ver o que se passa. Ligar o rádio. Com sorte é hora certa. TSF. Acelerar à saída do parque, ouvir as notícias com atenção. Olhar para o relógio. Estou a horas. Mudar de estação de rádio. Pôr a música mais alta. Cantar. Pôr os óculos de sol, que o sol de Inverno é traiçoeiro. Conduzir como quem vai numa viagem diferente todos os dias. Avisar a Cat do acidente do IC19. Ou comentar uma qualquer notícia do dia numa mensagem rápida. Receber um comentário engraçado. Rir sozinha. Dia alucinante. Escrever, telefonar, perguntar, escrever, escrever. Perguntar. Telefonar. Despachar telefonemas de pessoas que ligam a saber como estou. Comer rápido, tomar café rápido, chá rápido, casa-de-banho rápida, conversa rápida, queixume rápido. Actualidade. Actualidade. Actualidade. As eleições deixaram-me nostálgica. Estou de ressaca.

terça-feira, janeiro 18, 2011

sexta-feira, janeiro 14, 2011

26.


Acordei um tanto ou quanto entupida. Dores de garganta. Sem febre. Tomei banho rápido. Vesti as calças de cabedal. E umas sapatilhas novas, prenda de aniversário. Lisboa está com nevoeiro cerrado hoje. Vim a pé para uma nova rotina que teima em não se me entranhar na pele. É defeito ou feitio? Não sei. Sei que hoje são 26 dias 14 de Janeiro. Contei-os eu.

domingo, janeiro 09, 2011

dum instante.

Ouvia-se um grito no quarto take daquele vídeo de porque-é-que-eu-quero ser jornalista, que inevitavelmente saltou ao ouvido dos entrevistadores. Essa foi a primeira vez que alguém de lá me viu corar. Depois, da vez em que escrevi aquela reportagem sobre o Parque dos Poetas. "Mas qual foi a tua ideia de ires para um sítio daqueles com uma ventania assim? Achavas que conseguias uma história, era?". Sim. Acredito que as boas estórias podem estar em qualquer sítio, ao virar de uma esquina, em cima de uma mesa, no meio de papéis perdidos. Já acreditava nisso e aprendi-o, ainda mais, aí. Contigo. Ensinaste-me que nem sempre as coisas são como nós queremos e que os sonhos podem cumprir-se todos os dias, como uma rotina das boas. Fizeste-me corar com elogios que eu não merecia assim tanto. E fizeste-me chorar lágrimas de quem tem mãos e pés atados frente a um grande amor perante uma qualquer imposição. Viajei contigo e através de ti, dediquei-te horas a fio do meu tempo - que depressa passou a ser nosso tempo -, escrevi caracteres que nunca pensei sobre assuntos que nunca imaginei. Contactei pessoas que são estórias nelas mesmas, conheci gente interessante, escrevi histórias boas de escrever e dei graças por isso, sabendo muito bem o que era sentir que se tem a melhor profissão do mundo. Trabalhei com as melhores pessoas do mundo: as mais sorridentes, as mais empenhadas, as mais amorosas, as com melhor memória, as que fazem as melhores perguntas e as que escrevem melhor. E fiz amigos, tantos que não podem contar-se pelos dedos das mãos. Decorei números de telefone, tentei contactar presidentes importantes e consegui falar com alguns dos mais importantes protagonistas do mundo. Fiz-me tremer com a importância das coisas. Escrevi sobre a Casa Pia, sobre a mina de San José e sobre a ModaLisboa. Fotografei o Obama, observei de perto o Karzai e quase perguntei uma ou duas coisas ao Zapatero. Quis conhecer o Assange. Fiz perguntas e cansei-me de perguntar. E fiz tanta coisa. Coisas que parecem demasiadas para tão pouco tempo. Fiquei sem voz e atordoada. Falhei horas de sono sem sacrifício e sacrifiquei almoços e jantares por horas de trabalho. Fui tão mas tão feliz contigo que não sei o que te dizer. Assim, num intante, já disse tudo. Fiz de ti a minha vida.

sexta-feira, dezembro 17, 2010

retratamento

Agora estou amuada.
Trata de me desamuar se quiseres. Que a culpa foi tua.

domingo, novembro 28, 2010

D'ele

Ele tem os teus olhos, castanhos escuros. Com pestanhas compridas e enroladas nas pontas, nos cantinhos. Os olhos que pestanejam quando estás nervoso, ou quando não acreditas naquilo que estás a ouvir. Aqueles olhos que choram quando andas contra o vento frio. E o vento frio os fere e os gela, e lhes reclama as lágrimas. Tem aqueles olhos, os teus, os que te fitam sem pestanejar quando te tentam perceber.
Ele tem a tua boca rosada. Secam-se-lhe os lábios como a ti quando está frio e ele os humedece com a língua, sem perceber que aí está o segredo para não os secar. Ele tem-nos, como os teus, carnudos, ondulados, frenéticos e calmos ao mesmo tempo. Daqueles que se mexem depressa, como os teus. Daqueles que reagem ao toque com uma expressão poética.
Ele tem a tua pele pintada de pintas pretas. Tem a tua expressão de contentamento, as tuas rugas de desconfiança, o teu ar sisudo de quem não quer acreditar no toque. Ele tem a tua pele macia, a tua pele pouco enrogada ainda. Ele, como tu, reage ao toque das mãos frias e aconchega-se nas mãos quentes.
Ele tem, do lado direito do peito quando o olhas de frente, uma máquina cheia de energia que teima em nunca descansar. Tem-na ali, fechada, capaz de se proteger ao mínimo ataque. Ele, como tu, construiu-lhe uma fortaleza. Ele tem um aconchego. Como tu, ele tem um aconchego. Um olhar como o teu [o teu olhar?], uma boca como a tua [a tua boca?], uma pele como a tua [a tua pele?]. E uma fortaleza. Tal e qual a tua [será a tua?].

quinta-feira, novembro 25, 2010

oito e oito

É capicua, o número que fizeste um destes dias, como se a vida fosse um jogo de adivinhas. Tu serias uma das palavras mais complicadas e mais difíceis de dizer, pelo menos naquete tempo em que me ofereceste a BMX cor-de-rosa e preta cujos pneus eu por pouco não destruía de tanto os massacrar nas poças de água do caminho entre a tua casa e a nossa. Isto quando éramos vizinhos. Tão perto em distância, tão longe em afectos. Vocês - nem eu sonhava na altura - são os que mimam. Os que nos estragam fazendo todas as vontades, que passam os chocolates que os pais proibiram por baixo da mesa. Os que enrolam uma nota e a metem no nosso bolso das calças, mesmo que não precisemos. Os que nos contam as histórias dos disparates dos nossos pais quando eram pequenos. Todos os segredos guardados numa memória a longo prazo que quase nunca se apaga. Só que tu - nem eu sonhava - não eras isso quando moravas ali ao lado, quando podíamos ver-te todos os dias. É curioso como eu nunca percebi que tu não eras assim até ao momento em que tu passaste, de facto, a ser assim. Ninguém te ensinou a ser, e tu demoraste a perceber que os beijos e os abraços e as perguntas esquisitas não eram mais do que vontade de te sentir mais perto. Dizer-te 'olá', por estes dias, é um prazer. Porque te queixas que os anos pesam (e isso, desculpa, mas vê-se nos teus pés, que o teu corpo já não acompanha o ritmo da tua cabeça), mas não se percebe falando contigo. Percebe-se sim, a vontade que tens de inverter as coisas. Mas sei-te ainda muito pouco daquilo que quereria descobrir. Precisamos de mais horas, de mais tempo, de tantas conversas, de recuperar o caminho das poças de água e os pêssegos roubados ainda verdes. Precisamos de conversas demoradas, e de trocar ideias um com o outro. Que eu acredito que isso de trocar ideias é tão bom para quem as diz como para quem as ouve.
E que o inconformismo que escrevias no jornal quando metias as letras na máquina de escrever, tem-lo agora nas palavras. Isto de ser velho é aborrecido. Um dia explico-te porquê. Querias ser novo outra vez. E isso, aos 88, não é nenhum milagre. É de quem gosta de viver à séria.

quinta-feira, novembro 18, 2010

1/52


Os olhos na ponta dos dedos
Eu gosto muito de ler, e quando vivia na Alameda ia de autocarro para Campo de Ourique para lá, normalmente entretido a ouvir um livro. Quando dava por mim, tinha passado a paragem e já estava em Chelas. Perdi-me vezes sem conta no percurso casa-trabalho, apesar de saber de cor o caminho para o número 95 da rua Francisco Metrass, no bairro de Campo de Ourique em Lisboa. Entre 30 a 40 mil pessoas com deficiência visual procuram, por ano, a nossa ajuda. Reparamos as bengalas de cegos e amblíopes. E temos a maior biblioteca de braille do país. Temos livros portugueses e estrangeiros, e qualquer pessoa, mesmo que não seja associada, pode visitar-nos. São mais de 40 mil, entre obras em papel e em formato digital. Os livros ajudam a passar o tempo. O que é que as pessoas cegas fazem enquanto estão em casa? Ora, esperam muitas vezes o dia inteiro pela família. E tanta coisa podiam fazer. Sentir-se-iam úteis e seriam o orgulho da família. Porque eu sinto o orgulho dos meus filhos quando lêem as conquistas da associação, as minhas conquistas no jornal. Quando os meus filhos metem a chave à porta eu sei exactamente como eles vêm, como eles estão. Vejo pelo modo como eles põem a chave na porta. Vejo pelo tom de voz. Vejo pela maneira de andar, pelos passos. Eu não preciso que eles falem.
Este texto faz parte de 52 histórias do livro/agenda perpétua da ACEP e foi escrito a partir de uma conversa com Vítor Graça, da Associação Promotora do Ensino para Cegos (APEC). As histórias, contadas - e bem contadas - por mais 51 jornalistas e outros tantos fotógrafos, estão à venda online. Para serem partilhadas, como todas as boas histórias merecem.

terça-feira, novembro 16, 2010

¡Hola!

Faltava-me a inspiraçao para escrever. Mas hoje nem a falta de acentos me pára, que eu estou numa cidade que sinto minha, e ando num passeio sem calçada que parece a minha cara. Falei contigo ao telefone e contei-te da minha alegria. Acho que se me notou na voz a emoçao de voltar aqui, a um sítio que conta tanto das minhas histórias a solo. A um lugar onde eu comi tantos petiscos. A ruas que me lembram uma casa e um quarto diferentes dos que conheço agora. Quis chorar de emoçao quando te vi, tao solar, tao parecida com Lisboa. Tao à minha maneira. Tiveste hoje o poder de me revigorar, de me fazer sentir que há vida para lá da rotina, e de me trazer a vontade de escrever aqui. E isso nao era mais do que o que eu andava a precisar. Madrid.

quarta-feira, outubro 13, 2010

Chi-chi-chi. Le-le-le. Chile!

Dizer outra coisa qualquer ia estragar o dia mais importante da vida deles.
(mas que privilégio, às vezes, ser jornalista. E poder contar as boas histórias)

terça-feira, setembro 21, 2010