Apetecia-me...
Às vezes apetecia-me parar, no caminho para casa. Parar naquela ponte, que permite passar a linha do comboio. Apetecia que ela não tivesse aquela cor, aquela textura, aquela frequência às vezes aflitiva durante o dia e aquele silêncio arrepiante durante a noite. Às vezes apetecia-me sentar, naquela ponte que (apetecia-me) não tivesse aquele metal à volta a proteger das quedas. Apetecia-me sentar, deixar cair as pernas e ficar com elas a abanar...para trás e para a frente, para a frente e para trás. E depois ouvir o vento. Apetecia-me que nesses momentos os meus pensamentos não fossem interrompidos pelo barulho que me ensurdece, sempre que lá passo. A petecia-me ficar a ouvi-lo. Porque os pensamentos estão sempre em mim, quando passo naquela ponte. E apetecia-me sentar, baloiçar os pés e parar por momentos, num segundo. Assim, o momento iria parecer algum escondido num daqueles filmes em que os pés balançam e em que muitas palavras ficam por dizer porque a velocidade a que circulam na cabeça não o permite.
Apetecia-me depois ficar a olhar para Lisboa. Aquela que tenho vindo a conhecer, pouco a pouco, mas loucamente, como qualquer paixão em início de namoro. Eu namoro-a desde o primeiro dia. E apetecia-me ficar com ela, senti-la, enquanto baloiçava os pés. E apetecia-me ficar a pensar naqueles que fazem parte dos meus dias, naqueles que não têm estado cá, naqueles que estão, naqueles que riem e choram e gritam e refilam e brincam e fazem parte de mim. Daqueles que vejo todos os dias e daqueles que desde a véspera da partida deixaram saudades. Apetecia-me, quando me sentasse, lembrá-los todos e senti-los, no sopro do vento, todos lado a lado, ao meu lado, nessa ponte onde passo todos os dias. Apetecia-me que não houvesse combóio nem rede nem arame nem barulho. Apetecia-me que às vezes, Lisboa fosse só esta paixão, com silêncio e onde eu pudesse ouvir, quando me apetecesse, apenas o sopro do vento.
4 comentários:
Até me sinto lisonjeada. Muito bonita homenagem à minha cidade!...
Tu que também tens algo de cosmopolita nas veias, sabes, pelo que vejo, que a grande urbe dá bastante espaço aos pequenos prazeres. O caos, o ruído, esses pensamentos acotovelados parece que só alimentam a vontade de vigiar os pormenores!
O que se vê, ouve, cheira e sente numa possível paragem nessa passagem de nível, a balouçar as pernas... aiiii, dava um livro!
Ma che bello!Mi ha piaciuto molto questo testo (no so bene come si scrive).
...apetecia-me ter-vos por perto...
Baloiçar, como uma criança que ingenuamente sente cada brisa do ambiente que a envolve...sem dar por isso, já faz parte dele!
Tenho saudades de Lisboa, de vos sentir comigo!
*Adoro-te muito!
Também estou apaixonada por Lisboa, adoro-a de noite e de dia! Quando vamos dar mais umas voltas a pé?
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