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quarta-feira, dezembro 05, 2007

O metro, a cigana e as lágrimas teimosas
Coberta de preto a velha cigana senta-se no banco do metro. Vai nervosa, ansiosa, nota-se-lhe uma instabilidade latente.
As rugas de expressão que acompanham a cara escura, outrora simples e encantadora, carregam a carga emotiva que a transfigura. A velha cigana aperta as mãos devagar. Baixa a cara, vêem-se-lhe as riscas na testa de tanto a engelhar, do sol, da vida. Depois, a cabeça entra quase entre os ombros e começa a gemer muito baixinho. Aperta os dedos contra os olhos num movimento repetido e aflitivo. Desespera, chora baixinho e sem lágrimas. Vida dura, corpo cansado. Mãos marcadas pelo passar dos anos, agora denunciado por não conseguir chorar.
Não chora a velha cigana vestida de negro. Geme de tanto tentar e não conseguir. A velha Lisboa entrega-se-lhe depois, quando sair do metro e vir a luz do dia. Corre e mostra-lhe que o dia é muito mais do que aquela velocidade a que o metro percorre os finos carris debaixo da terra. Se vivesse sempre como topeira nunca poderia sequer supor...tentar por momentos imaginar...adivinhar aquilo que se passa na vida daquela velha cigana de pele bonita. As rugas marcam os caminhos daquela cara viajante. Mas o tormento...sim...o tormento é a evidente dificuldade que as lágrimas têm de lhe percorrer a cara. Uma dificuldade em não saber ou em não conseguir chorar.

3 comentários:

Bruno disse...

As riscas na testa de tanto a engelhar, do sol, da vida...
(...)
... o chorar baixinho...
(...)

Simplesmente:
L
I
N
D
O
!
!
!
!
!

Catarina disse...

Pequenos pormenores que raramente nos passam despercebidos..*

Deb disse...

E eu que deixei de gostar de ciganas...

Mas que bonito está, como de resto sempre, esses teus retratos por essa Lisboa fora.

Vá, vá, vai escrevendo mais.