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domingo, fevereiro 01, 2009

gostava de nadar fundo. gostava de ir lá abaixo e ver o que lá há.

Acordo com um sussurro. Há uma voz trémula, sem compasso, irregular. Um choro abafado, e palavras, muitas, seguidas. As frases tornam-se difíceis de perceber porque está longe, e fala baixo e depressa. Abro os olhos, inchados. Olho para o relógio, debaixo da almofada. É cedo. E parece que ainda não acordei. E aquela voz cria um ritmo, uma melodia. É fundo à chuva que cai lá fora. E ao sopro enfurecido do vento. Ouço com atenção a ver se percebo. Nada. Nem uma palavra. Não quero interromper a oração. Espero. Queria perceber e agora tento abafar as palavras. Tento fechar os olhos e voltar a dormir. É cedo. Cedo demais.
Trémula, abraça a botija onde a água já está morna. Encosta-se ao cadeirão, no cantinho. Aconchega a manta no colo. É frio. É cansaço.
Ajeita a almofada. Passa a botija para trás. Levanta-se. Vai buscar um copo de água. Senta-se. Levanta-se. Vai buscar um guardanapo. Senta-se. Levanta-se. Vai buscar outra qualquer coisa que já não me lembro. Quebra o silêncio. Frio. Cansaço. Solidão. Passos incertos. Não consegue assinar o nome. Perde a identidade pela incapacidade de se escrever. Sente-se fraca. Diminuída. Fala da doença. É a doença. Não a idade. É a doença que me põe assim. Reduzida a um corpo débil, velho e cansado, dormente a maioria das vezes. Doente. Preciso de dar um jeito em mim mesma, ver se tenho alento. Já lhe dava jeito, já. A ver se consegue nadar bem fundo, a ver o que há no fundo do mar.

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