Havia uma cadeira pequena, de pinho claro, onde eu me sentava horas a fio à tua espera. Lembro-me que na véspera, mal conseguia dormir a pensar que vinhas, e logo de manhã, mal me vestisse, sentava-me no telheiro da cozinha a pensar no momento em que veria o teu carro passar o portão. Vivias longe, viamos-te pouco e eu sentia muito a tua falta. E não havia maneira de arredar pé dali, antes que chegasses. Mal via o carro passar o portão, corria à cozinha a avisar toda a gente. Os manos mal reagiam, mas eu não fazia caso. Abria a porta que dá para a garagem e, com todo o cuidado, descia as escadas. Caí lá muitas vezes a descê-las com a pressa, por isso não podia arriscar. O teu cheiro lembrava-me frutos secos ou noz moscada. Não que eu soubesse exactamente a que cheirava a noz moscada, mas sei que o teu cheiro era quente. Familiar. Cheiro em tons pastel, sabes? E cheiravas sempre ao mesmo. A avelãs, a camisolas quentes, a lenha de lareira ainda por acender. Cheiravas a castanho, a Outono, a chocolate negro.
E vejo agora que estes cheiros são bem diferentes. E na altura pareciam-me tão iguais, como nós éramos. Como eu fazia questão que fôssemos. Só que as coisas mudam. E eu apercebi-me que o modelo que eras não era, afinal o modelo que eu pensava que eras. Agora sou eu que te visito, que as tuas pernas já não conseguem acelerar o carro vermelho como dantes. Nem os teus olhos são tão rápidos para acompanhar as velocidades da auto-estrada. Nem sequer os teus braços conseguem mover-se de maneira a manejarem sem dificuldades o volante. Pediste-me de maneira irrecusável e eu fui. E tu disseste-me que ficaste sentada na tua cama - que o quarto tem uma janela enorme que dá para ver a estrada e o parque de estacionamento - a esperar por mim. E eu apercebi-me do quanto as coisas mudam. Só que não sabes a cor do meu carro. Nem o modelo. Nem a matrícula. Como é que conseguirias esperar-me assim, como eu te esperei tantas e tantas vezes. E será que, quando me cumprimentaste, também te cheirei a chocolate negro, e a frutos secos, e a noz moscada?
3 comentários:
Tenho saudades suas... :)
Só nao tenho saudades das tuas palavras porque gentilmente acedeste partilhá-las (e escrever algumas delas) comigo.
Saudades. Cansativa!*
Gostei... E cada vez mais,por muito que custe, a realidade é visivel aos meus olhos durante tantos anos cegos... não conhecemos ninguém... muitas vezes nem a nós mesmos....
You have a stamp...
@Letras ;)
Bjos e saudades!*
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